Listas dos melhores 2006
· 28 Dez 2006 · 08:00 ·

Top álbuns 2006 · Top álbuns portugueses 2006 · Momentos 2006 · Tops ilustres

© Teresa Ribeiro

Depois das intermináveis listas dos melhores discos, há que registar os melhores momentos do ano. Em 2006 não houve Arcade Fire, não houve Animal Collective nem cacilheiro e o festival Paredes de Coura foi mais morno. Mas continuaram a haver muitos e bons concertos para todos os gostos. A ZDB manteve uma programação exemplar (a grandiosidade dos Comets On Fire foi unânime), a Casa da Música continuou a mostrar-se atenta e ampla (Steve Reich, Faust, Archie Shepp, Spring Heel Jack, etc) e afirmaram-se outros pólos que prometem concorrência aos sítios habituais (Casa das Artes de Famalicão, Theatro Circo, em Braga). Os festivais – campestres ou urbanos – continuaram a quebrar a normalidade (desde Broken Social Scene, The Strokes ou Yo La Tengo, até Anthony Braxton ou Peter Brotzmänn). Para lá da chegada de Cavaco à Presidência, do quarto lugar no Mundial de futebol e da popularidade mainstream do Gato Fedorento, houve uma imensidão de pequenos factos que individualmente nos marcaram em 2006. A reformulação gráfica deste espaço foi o motivo que reuniu esta turma numa bela festa no bar Lounge, em Lisboa, por exemplo. O ano 2006 foi feito de momentos, instantes e recordações, mais ou menos pessoais ou partilhados, mais ou menos sérios ou irrelevantes. Aqui estão alguns deles. Nuno Catarino


André Gomes
© Angela Costa
Em Vilar de Mouros, Iggy Pop e os seus Stooges assinaram um concerto memorável. Velhos são os trapos. Em “No Fun”, Iggy Pop convida membros do público a subirem ao palco lembrando os momentos de maior caos dos concertos de Stooges dos primeiros tempos. A iguana em forma.
“Promiscuous” de Nelly Furtado, como bandeira da pop mainstream inteligente e viciante. Não terá sido a primeira, pois 2006 foi ano de constante lifting estético por parte de algumas estrelas pop – Mariah Carey, Christina Aguilera, Justin Timberlake, entre outros.
Ryoji Ikeda no Museu Reina Sofia em Madrid, sessão massajante da mente e de todos os sentidos humanos possíveis. A apresentação de Dataplex ao vivo – e com entrada gratuita –, mais do que um concerto, foi uma experiência sensorial que deixou marcas profundas, especialmente durante “Data.Matrix”, momento inesquecível da noite.
O ano de ascensão do dubstep com o par de discos de Burial e Kode 9 & Spaceape na linha da frente e em claro destaque. A chegada do fenómeno a Portugal (no que diz respeito a concertos) acontece também em 2006, motivo para saudações e esperança.
O momento em que as guitarras velozes anunciam “Lollipop” e uma explosão incontrolável de cores em plena calle Fuencarral, em Madrid, depois da chuva ter desaparecido e ter dado lugar a alguns raios de sol. É o concerto dos Hidden Cameras, autores do disco pop (indie ou não) do ano. Há quem salte e há quem sorria; e já quase toda a gente esqueceu o dia escuro e nublado.
O ano de explosão da musica periférica portuguesa com os Loosers à cabeça. A confluência dos muitos discos com as muitas actuações ao vivo faz de 2006 um ano riquíssimo para a música portuguesa não atingida pelos holofotes.
Quando se escutaram os primeiros acordes de “Dogwood rust” todos sabiam que já não havia regresso possível. Não podia ter acontecido em melhor local: o Porto Rio. Os Comets on Fire levaram o rock para outro nível; um superior.
No seu segundo ano, a Casa da Música como continuação do pólo aglutinador de todas as musicas: desde Cristina Branco a Sunn 0))) e Earth, passando por Fred Frith, Pelt, Archie Shepp & Dar Gnawa, entre outros.
A consolidação do Myspace como fonte de descoberta de novos projectos e esperanças à distância de um clique ou dois.
A reabertura do Theatro Circo como revitalização esperada das salas de concertos a norte do Porto. Lisa Germano, Antony, The Red Crayola, entre outros, criam a esperança de um 2007 próspero para Braga.


Eugénia Azevedo
A vantagem que oferece o Porto em termos de proximidade a novos pólos de atracção cultural, como Vila Nova de Famalicão; o concerto de Yann Tiersen na Casa das Artes.
O produtor Trevor Jackson a animar a noite portuense na recém-inaugurada discoteca Pitch; não há que enganar: o Porto é incrível por ser igual a si mesmo, mas naquela noite podia ser Londres ou Berlim.
O prazer de descobrir a melhor música feita por cá: Dead Combo, no Tertulia, no rescaldo dos festejos do meu envelhecimento.
A oportunidade de ver, em Paredes de Coura, com anos de atraso, os noruegueses Madrugada e a nostalgia de os ouvir tocar "Majesty"; a majestade aqui presente seria, no entanto, Morrissey.
A descoberta tardia do cineasta Nanni Moretti no evento "Cinema Fora de Sítio" no Porto; o final de "O Quarto do Filho", ao som do inesquecível "By This River" de Brian Eno.
O Porto Rio como alternativa aos mais politicamente correctos poisos musicais; o concerto dos Liars.
A sorte de termos como cidadão português uma figura como a de J.P. Simões; a prestação intimista a que assisti na ZdB.
Eventos que não deviam acabar: a festa da música no CCB e o festival de Cinema Indie, em Lisboa; um encontro imediato às portas do indie, antes do visionamento de um documentário musical.
A malta que faz o Bodyspace existir reúnida no Lounge para celebrar com os One Might Add a continuidade e solidez do projecto.
Um geniozinho que demorei a descobrir: Bernardo Sassetti, que proporcionou um concerto a todos os níveis memorável no Teatro Nacional de S. João; aguentaria certamente anos de aridez musical por uma noite como esta.



João Pedro Barros
A descoberta, no TNSJ, de que recitais de piano também podem ser coisas agradáveis. Mérito de Mário Laginha e, especialmente, de Bernardo Sassetti.
Deerhoof e Liars num sítio especial como o Porto-Rio: dois concertos que não deixaram ninguém indiferente e que fazem pensar que o rock continua em mutação.
Morrissey a abandonar o palco de Paredes de Coura a meio de “Panic”: uma metáfora de um festival que, depois de um ano bombástico, teve uma edição assim-assim. O regresso à terra era inevitável…
Adam Green no Festival para Gente Sentada: com ou sem substâncias estimulantes, e apesar da trapalhice, concertos assim deixam qualquer um bem disposto.
A certeza de que os concertos de estádio não são para mim, acompanhada da certeza de que o género não pode ser maior do que com os Rolling Stones.
Ver pela primeira vez, com algum atraso em relação ao hype, a força dos Linda Martini ao vivo e perceber que apenas está ali a ponta mais visível de todo um underground nacional que tem ideias e vontade de as concretizar.
Guilty pleasures mais ou menos assumidos: Nelly Furtado e… Fergie!
O fim do Blitz: surgiu uma revista mas, por exemplo, as críticas de concertos são cada vez mais uma raridade. A Net é a solução?
A reabertura do Theatro Circo, uma esperança que se junta à Casa das Artes de Famalicão numa exploração da música moderna em formas alternativas mas não elitistas. O futuro pode ser periférico.
A Festa Bodyspace no Lounge: novo encontro da “malta” que faz este sítio, no Porto, é OBRIGATÓRIO!


Miguel Arsénio
Aperitivos chineses e caju do LIDL.
John Cassavetes, Orson Welles e Robert Altman (shine on, you crazy maverick).
Os drones de Beautiful Schizophonic e "Psicologia" dos Feromona.
Buffets luxuosamente acessíveis, tartes, Serralves e Roman Porno no Porto.
Monumento de classe: Scarlett Johansson. Puro trash: Fergie.
Todo o Japão é bom Japão: pop, improvisado, aleatoriamente escutado, filmado por Ozu e Suzuki.
Confraternizar por casualidade com o crew da dupla VJ / DJ Hifana com o primo Mr. Mute da também dupla VJ / DJ Deubreka.
O kraut de máquinas dos One Might Add e a turma Bodyspace reunida num mesmo Lounge.
Portugal x México em boa companhia entre vizinhança hostil.
A aliança mantida com a Teresa Ribeiro.


Nuno Catarino
© Susana Paiva
O fabuloso quarteto Vandermark/Lane/Broo/Nilssen-Love em Coimbra, onde conheci a Olga.
O regresso de Keith Jarrett com o seu trio Standards, na companhia da Marisa.
O estrondo dos Comets On Fire na Zé dos Bois, no dia em que conheci a Joana.
O jazz enérgico dos The Bad Plus em Sines, na companhia da Carla.
A espantosa electrónica de Jan Jelinek na Zé dos Bois e o sorriso da Margarida.
A força brutal de Peter Brötzmann no Parque Mayer e o espanto da Sónia.
O génio de Chico Buarque no Coliseu e as palmas da Paula.
A criatividade de Anthony Braxton na Gulbenkian vista da primeira fila, ao lado da Fil.
Os inúmeros concertos ao fim da tarde na Trem Azul de copo de vinho tinto na mão e a alegria da Felisbela.
As tentativas de DJ set no LEFT e os cortes de cabelo da Inês.


Pedro Rios
A afirmação dos Loosers como líderes naturais de uma nova cena de rock underground português. Posso estar a ser traído pela minha juventude, mas arrisco dizer que nunca houve uma movida underground tão forte em Portugal, com estruturas fixas (ZDB, Lovers&Lollypops, etc.), canais de comunicação (MySpace), salas para tocar e bandas com vontade de criar.
O Out.fest 2006 enquanto festival congregador da gente acima referida, a decorrer num ajustadamente periférico Barreiro.
A descoberta mais aprofundada da música de Loren Connors, guitarrista de excepção.
Outro guitarrista, ainda por cima português: Norberto Lobo. Carlos Paredes a inspirar um guitarrista a fazer algo seu. Esperam-se voos altos para Lobo.
Lobster na casa de banho da Universidade Católica do Porto a fazer lembrar o que imaginamos terem sido os concertos hardcore dos anos 80.
Comets On Fire a armar um circo rock'n'roll no Porto Rio e a tornar ainda maior Avatar - como sempre, o bom rock clássico faz mais sentido em palco do que em disco.
No mesmo palco, o rock de contornos agrestes/delicodoces dos Deerhoof, finalmente ao vivo em Portugal.
A ressurreição do punk durante uma hora no Festival Vilar de Mouros. Iggy Pop reeditou o motim que provocou no Super Bock Super Rock em 2005, agora com direito a pó no ar.
Sunn 0))) na Casa da Música: mais do que um concerto, uma experiência física de uma banda com uma importância tremenda na destruição de fronteiras musicais e de preconceitos em torno do metal.
No-Neck Blues Band, também na Casa da Música, a questionar as noções de sucesso ou insucesso na música.


Rafael Santos
Dubstep: Ano de consagração de um dos mais interessantes fenómenos musicais nascidos nos underground’s de Londres. Não é a cura, mas sim um exemplo de inventividade num meio com pouca vontade de criar. Além de Burial e Kode 9, Benga, Skream, Loefah, Digital Mystik e a colectânea The Roots of Dubstep também marcam o ano.
A resposta ineficiente do estado no combate á corrupção. Ineficiente por incompetência? Ineficiente por realmente não ser uma verdadeira prioridade?
Um estado sem moral corrompe um país. E assim não vamos lá.
Ubiquity Records é provavelmente uma das editoras do ano. Revelou uma vez mais conhecimentos de mercado e ecletismo na escolha de músicos e produtores para o seu catálogo: Nomo, Nino Moschella, Radio Citizen ou Owusu & Hannibal. Exemplos de revelações em 2006.
Penalização da pirataria musical. John Kennedy da Federação Internacional da Industria Fonográfica e a SPA chegaram e decretaram o disparate: alertaram os pilhantes que estão sujeitos a receber na caixa de correio um convite para pagar uma multa por desrespeito aos direitos de autor. Talvez a solução passe primeiro por criar-se legislação própria antes de gastar-se dinheiro em selos.
A nova música urbana portuguesa começa a dar passos seguros para um novo nível: a segura experimentação de novas linguagens. Buraka Som Sistema e Double D Force são prova disso. O hip hop tuga conheceu finalmente dois excelentes discos: Cinema... de Sir Scratch e Pratica(mente) de Sam The Kid. Lentamente chegamos lá.
A Flur voltou a revelar-se como uma das melhores lojas de discos em Portugal. O atendimento é simpático e competente. O leque variado de cd´s e vinil permite uma tarde bem passada enquanto desfrutamos das últimas novidades ou recuperamos raridades perdidas.
O lento desaparecimento da imprensa musical profissional. Com excepção dos pequenos suplementos semanais e de bons sites ou blogs, a imprensa musical praticamente desapareceu. O fim do Blitz em jornal semanal e o início de uma ineficiente revista mensal é mais um infeliz episódio de como a qualidade começa a escassear.
Big Apple Rappin: Compilações assim têm de ser obviamente elogiadas, tanto pelo conteúdo propriamente dito, tanto pelo profissionalismo de quem, com um excelente trabalho de investigação, nos proporcionou um documento que agora retrata um determinado período que mudou inevitavelmente o rumo da música popular deste planeta. Uma grande salva para o bom gosto da Soul Jazz Records.
Televisão. O ano Floribella num país de morangos enchafurdados só revela que temos, infelizmente, mais perfil para nação de terceiro mundo do que para país evoluído. Programas sobre música na TV, para variar, são praticamente inexistentes.
Daft Punk no Sudoeste. Na memória de muitos ainda está bem presente o magnífico espectáculo multimédia da dupla francesa. Poderão ter passado o tempo a jogar Playstation, mas o espectáculo foi intenso e majestoso.


Rodrigo Nogueira
A existência geral do Interface da AOL, do Jamie Lidell a dizer que é virgem mil e quinhentas vezes por segundo aos TV On The Radio acústicos;
O visionamento do acontecimento cultural do ano (Snakes on a Plane); a primeira vez que ouvi "I'm tired of these motherfucking snakes on this motherfucking plane, I'm tired, I'm tired, I'm tired", no melhor single de todo o sempre, "Ophidiophobia" da crew Organized Noize e do Cee-Lo Green;
Os Comets on Fire na ZDB, concerto que só poderei resumir com um palavrão (um gigântico "foda-se");
"'se pimpin'", a expressão que inventei que descreve na perfeição a vida em Lisboa na segunda metade do ano (com um advérbio de modo como "totalmente" antes);
Ter dito à tipa dos Deerhoof que ela era a minha heroína pessoal;
A primeira vez que ouvi o disco dos Clipse e pensei: "Foda-se, isto são drones de harpa num disco de hip-hop mainstream? Vou já começar a vender droga.";
As barbas em geral, especialmente a do David Cross e, talvez, a do Kyp Malone, o homem com mais estilo de sempre;
Ver os Yo La Tengo depois de, por estupidez, os ter falhado há 5 anos;
"Nine Samurai" de Kode 9 & The Space Ape ao vivo naquele sítio que é por debaixo da Rua do Alecrim ao pé das prostitutas e dos antros todos;
Terem-me oferecido o segundo disco do Prince em vinil, nunca o ouvi (faço tenções de, ainda não deu) mas a capa é a melhor capa de todo o sempre: o homem de bigode e cabelo grande em tronco nu sobre um fundo azul (a parte de trás não fica nada atrás: o Prince nu em cima de um cavalo com asas), foi a melhor prenda de todo o sempre, seguida pela autobiografia de um génio que dá pelo nome de Bruce Campbell;

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